ESTUDIOS  
A JUSTIÇA SOCIOAMBIENTAL COMO FUNDAMENTO CONTRAHEGEMÔNICO
À GLOBALIZAÇÃO E À MERCADORIZAÇÃO AMBIENTAL

   
Bruno Cozza Saraiva [*]
Francisco Quintanilha Véras Neto [**]



Resumo:
O presente trabalho busca elucidar sobre a perspectiva de um ideal de Justiça Socioambiental relacionada à busca de alternativas ao processo de Globalização neoconservadora a servir em prol das maiorias excluídas no Sul devido à crise sistêmica intensificada por processos políticos, econômicos e culturais. Necessariamente, as relações socioeconômicas com o meio natural, devem ser analisadas sobre a luz da concretização da Justiça Socioambiental. A partir da constitucionalização da proposta de um novo paradigma ecológico, se tem como finalidade atender aos anseios sociais por uma sociedade justa nos parâmetros adequados à manutenção das bases de reprodução natural que, essencialmente,vislumbram propiciar a coexistência harmônica de homem/ natureza a partir dos pressupostos constitucionais.

Palavras chave: Justiça Social, Justiça Ambiental, Globalização.


Resumen:
Este estudio tiene como objetivo esclarecer la posibilidad de un ideal de justicia ambiental relacionada con la búsqueda de alternativas al proceso de globalización neoliberal que sirve a favor de la mayoría excluida en el sur debido a la crisis sistémica intensificada por la. Política, económica y cultural Necesariamente, las relaciones socioeconómicas con el entorno natural debe ser analizado a la luz de la aplicación de la justicia ambiental. Desde la constitución de la propuesta de nuevo paradigma ecológico, que tiene como objetivo responder a las expectativas sociales de una sociedad justa en los parámetros adecuados para mantener las bases de la reproducción natural, que básicamente proporcionan un vistazo a la convivencia armoniosa del hombre / naturaleza de la supuestos constitucionales.

Palabras clave: Justicia Social, Justicia Ambiental, Globalización.


Abstract:
This study aims to elucidate the prospect of an ideal of Environmental Justice related to the search for alternatives to the process of globalization neoconservative serving in favor of the excluded majority in the south due to the systemic crisis intensified by the political, economic and cultural. Necessarily, the socioeconomic relations with the natural environment should be analyzed on the light of the implementation of Environmental Justice. From the constitution for the proposed new ecological paradigm, it aims to meet the social expectations for a just society in the appropriate parameters to maintain the bases of natural reproduction, which essentially provide a glimpse harmonious coexistence of man / nature from constitutional assumptions.

Keywords: Social Justice, Environmental Justice, Globalization.



1. Introdução
Analisando a realidade socioambiental da contemporaneidade, tendo-se como intento a probabilidade de construção da Justiça Social e Ambiental em face do crescente domínio neoliberal/neoconservador propiciado pela globalização[1], nota-se a inexistência de pressupostos indispensáveis para a concretização da Justiça Social[2] e Ambiental. A transnacionalização e a globalização[3] econômica geram a concentração da riqueza mundializada, a ampliação da miséria e a degradação ambiental localizada e globalizada. Países desenvolvidos poluindo Estados em desenvolvimento, efetuando queimadas, se industrializando, urbanizando sem infraestrutura social e sendo vítimas da externalização do custo ambiental por transnacionais de países ricos fomentadas pela OMC e pelo Multilateralismo do Banco Mundial e do FMI. Presentemente, a carência de Justiça faz com que a sociedade inexista para seu fim. Entende-se por Justiça Social, a respeitabilidade e a materialização dos direitos sociais e ambientais dos cidadãos que tendem a possibilitar a coexistência harmônica entre a coletividade e o meio natural.

Diante dessa proposta, acreditar-se-á tecer sucintos comentários em prol do complexo assunto. Para isso, tratar-se-á a Justiça Social e Ambiental de modo a atuar como principal projeto de sustentabilidade socioambiental da futura sociedade balizada na estabilidade social e ambiental promovida pela efetivação dos direitos sociais e ambientais. Praticando-se a defesa de que sem Justiça não há sociedade, também, diante da imprescindibilidade da manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, discorrer-se-á em prol da Justiça Social como fundamento da Justiça Ambiental, requisito indispensável para a sustentabilidade das necessidades básicas das populações humanas e da manutenção do equilíbrio entre sociedade e ambiente, necessariamente, caminhando para um paradigma holístico e interdisciplinar em que o saber empoderará novas relações entre sociedade e natureza, pois a primeira realidade não se dissocia da segunda.

 

2. Justiça Social
Ao se adentrar em um tema de tamanha complexidade, cabe indagar a possibilidade de realização da Justiça Social a partir das condições evidenciadas na presente sociedade. A Globalização desenfreada, o controle mercadológico, restringe a probabilidade de plenitude das condições mínimas de sustentabilidade dos cidadãos, pois a carência social mina as condições ambientais das atuais e futuras gerações, contrapondo-se ao ideal paradigmático da responsabilidade intergeracional socioambiental. Diante disso, a denominação justiça, caracterizada de maneira prática, explicita a idéia de justo, certo, ético, provido de moral, ou seja, atributos inseparáveis em prol da construção de um mínimo de sustentabilidade social e ambiental razoável em um Estado de Direito Democrático, que constitucionaliza e concretiza efetuando a força normativa da Constituição dentro do paradigma hermenêutico de justiça socioambiental, promovendo a igualdade e a solidariedade material, não apenas formal. Em prol de avalizar a Justiça Social torna-se necessário que o Estado, garantidor da completude de uma ordem social, seja o fundamental propulsor da concretização dos direitos sociais que, essencialmente, incidirão no panorama ambiental, transformando o espaço urbano e atribuindo à população melhores condições de vida em harmonia com o meio natural. Não obstante, se tem que uma sociedade só é justa quando os cidadãos usufruem de condições concretas – amparadas democraticamente – garantindo o equilíbrio social.

Ante a imprescindibilidade nas relações básicas entre os indivíduos, a Justiça, de forma abstrata, é característica essencial da liberdade atribuída ao cidadão para relacionar-se no meio em que vive. “[...] Porém, ‘justo’ é o indivíduo que faz o certo ou tem a intenção de fazê-lo e que vê e trata os semelhantes – seja em disposição ou em conduta efetiva – à luz da igualdade requerida. Aqui a ‘justiça’ é um valor de ação da pessoa, é um valor moral.” (ADEODATO, 2009, p. 165) Decorrente disso se acredita que agir com liberdade é possível, à medida que nessa ação, se busque garantir a respeitabilidade das normas sociais. Visando manter a harmonia social, a idealizada busca pela igualdade jurídica material e, também, social, faz referência, ao mesmo tempo, a incessante caminhada em prol da Justiça Social que, para muitos, representa a igualdade.

A justiça é a virtude moral que rege o ser espiritual no combate ao egoísmo biológico, orgânico, herdado pelo indivíduo enquanto animal, para a luta pela vida. Seu caráter mais evidente é a igualdade, a igualdade de direitos e deveres que possibilitam a vida em comum. Claro que esse princípio formal poderia abrigar conteúdos diversos. Para muitos pensadores e políticos, por exemplo, igualdade significa uma mesma norma para indivíduos na mesma situação, a isonomia, admitindo normas diferentes para contextos diferentes; como um caso real é sempre individual e irrepetível, este princípio de igualdade (tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais) é retoricamente manipulável. (ADEODATO, 2009, p. 164) s.


A perspectiva de Justiça, identificada com o conceito de felicidade individual e o juízo de valor que cada cidadão faz de Justiça e faz de Felicidade é, necessariamente, utópico. Equivocadamente, decorrente do pensar egoísta da grande maioria populacional, se almeja, unicamente, a Justiça e a Felicidade para si, oprimindo conceitos distintos das mesmas. Contrapondo-se a isso, tem-se que ambas devem ser ponderadas coletivamente, pois a ordem social precisa ser pensada em prol da comunidade e, para isso, não almejar a garantia do justo e do ideal ao uno e, sim, ao coletivo, entendido não como abstração jurídica mais como realidade sociológica constitucional.

A igualdade de todos em relação a todas as posições jurídicas não produziria apenas normas incompatíveis com sua finalidade, sem sentido e injustas; ela também eliminaria as condições para o exercício de competências. [...] É também claro que o enunciado da igualdade não pode exigir a igualdade de todas as características naturais e de todas as condições fáticas nas quais o indivíduo se encontre. Diferenças em relação à saúde, à inteligência e à beleza podem ser talvez um pouco relativizadas, mas sua eliminação se depara com limites naturais. A isso se soma o fato de que a igualização de todos, em todos os aspectos, seria, mesmo que possível, indesejável. A igualização de todos, em todos os aspectos, faria com que todos quisessem fazer sempre a mesma coisa. Mas, se todos fazem a mesma coisa, somente é possível atingir um nível intelectual, cultural e econômico muito limitado. (ALEXY, 2006, p. 396-397)

Em se tratando de Brasil a Justiça Social tem por finalidade irradiar toda a Constituição da República Federativa do Brasil, mas, em alguns artigos, se tem um parecer mais evidente de tal fim. Para explicitar tal ideal, alude o Art. 6 e o Art. 225, respectivamente: “São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição; Todos têm o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”

[...] Indivíduos diferentes têm concepções bem diferentes daquilo que seja felicidade. A felicidade capaz de ser garantida por uma ordem social só o é num sentido objetivo-coletivo, nunca num sentido subjetivo-individual. Isso significa que, por felicidade, somente poderemos entender a satisfação de certas necessidades reconhecidas como tais pela autoridade social – o legislador –, como a necessidade de alimentação, vestuário, moradia e equivalentes. É inquestionável que a satisfação de necessidades socialmente reconhecidas é algo totalmente diverso do sentido original da palavra, o qual, de acordo com sua natureza mais profunda, é altamente subjetivo. O anseio por justiça é tão elementar, está tão profundamente enraizado no coração do homem, justamente por exprimir um anseio indestrutível da própria felicidade subjetiva. (KELSEN, 2001, p. 3-4)

As garantias estipuladas pela Constituição Federal exprimem a perspectiva de Justiça Social e Ambiental pretendida em um Estado Democrático. A imprescindibilidade da concretização de tais direitos é o fundamento basilar da Igualdade Social entendida como Justiça. Cabe indagar, se a real materialização de tais regras sociais é possível em uma sociedade globalizada regida, necessariamente, pelas regras de mercado. Indubitavelmente, a efetivação da Justiça não se realizará em uma sociedade de risco. Para o modelo econômico capitalista a premissa de igualdade aduz a possibilidade das mesmas oportunidades econômicas. Contrapondo-se a isso, se questionam quais são as possibilidades de igualdade em um sistema e, em uma sociedade, inteiramente marcados pela desigualdade decorrente de políticas transnacionais? “Diz Marx que, na realidade, se trata de um direito desigual, pois não leva em consideração a diversidade existente entre os homens no tocante a sua capacidade de trabalho”. (KELSEN, 2001, p. 16)

Na esteira de globalização “emerge um complexo arranjo de condições e de poderes”, escreve Held, “que oprime com eficiência os governos e os Estados ao estabelecer limites para uma política interna independente, transformar as condições de decisão política, alterar radicalmente as premissas institucionais e de organização, além do contexto da política nacional, e se alteram as condições legislativas para a ação administrativa e política, no sentido de que a responsabilidade e a aceitação das conseqüências já são praticamente impossíveis para o Estado nacional. Se tivermos presentes apenas estas conseqüências da globalização, então terá sido justificada a afirmação de que a capacidade de atuação dos Estados corta a ambos em um contexto internacional cada vez mais complexo, a saber: a autonomia estatal (de forma radical em alguns setores) e a soberania estatal. (BECK, 1999, p. 76-77)

De imprescindível necessidade, é ressaltar a possibilidade da contemplação de uma Democracia moldada a partir de um Estado que garanta ao seu nacional usufruir plenamente de Direitos Fundamentais, especialmente aqueles que promovem transformações estruturais na modificação da sociedade e de estilos de vida capazes de promover igualdade, justiça, equidade, solidariedade. Requisito indispensável para a concretização da Justiça Social, a Democracia, muitas vezes ameaçada, e, em alguns países, ainda não inteiramente consolidada, é o fundamento que permite a idéia de viver dignamente, garantia máxima expressa na “Carta Magna”. A partir do momento em que inexiste democraticamente o governo, também, todo um imaginário de Justiça desaparece. A população fica a mercê do totalitarismo, contrário a possibilidade de garantir as necessidades básicas de sustentabilidade do povo. Ante a indispensável conservação da Democracia, é de suma importância a participação popular. O cidadão ativo, não o passivo, é parte essencial na consolidação de um governo do povo, que garanta e sane as deficiências populacionais. Só assim, a Justiça Social será realidade plena na sociedade.

Um dos trechos mais exemplares a este respeito é o que se encontra no capítulo sobre a melhor forma de governo das Considerações sobre o governo representativo de John Stuart Mill, na passagem em que ele divide os cidadãos em ativos e passivos e esclarece que, em geral, os governantes preferem os segundos (pois é mais fácil dominar os súditos dóceis ou indiferentes), mas a democracia necessita dos primeiros. Se devessem prevalecer os cidadãos passivos, ele conclui, os governantes acabariam prazerosamente por transformar seus súditos num bando de ovelhas dedicadas tão-somente a pastar o capim uma ao lado da outra (e a não reclamar, acrescento eu, nem mesmo quando o capim é escasso). (BOBBIO, 2000, p. 44)



3. Justiça Ambiental
Tema de tamanha complexidade e de carência de tratamento por parte das políticas nacionais e internacionais, a Justiça ambiental foi e vem sendo negligenciada no Brasil e no mundo global. Diante da imprescindibilidade de conservar um meio ambiente ecologicamente equilibrado, buscar-se-á, aqui, discorrer em prol da garantia de sustentabilidade socioambiental para as gerações atuais e vindouras. Explicitar a idéia de que as minorias excluídas (no Brasil maiorias), negros, índios e a população economicamente desfavorecida são os mais afetados pela inexistência de Justiça Ambiental que, inegavelmente, é de fundamental necessidade. Segundo José Renato Nalini (2008, p. 381-382), “[...] convém ter sempre presente que em situações de extrema pobreza, os indivíduos excluídos da sociedade não possuem compromisso algum para evitar a degradação ambiental, se a sociedade não é capaz de impedir sua própria degradação como seres humanos”.

Tratar-se de Brasil, possibilita mencionar que a Legislação Ambiental Brasileira é voltada para a concretização da Justiça Ambiental. Mas, diante das condições ambientais visíveis, se nota a contradição entre à Lei e a forma com que o meio ambiente nacional foi e vem sendo considerado. Garantir a proteção de um sistema ambiental não é simplesmente garantir a intocabilidade e a sustentabilidade do mesmo. É, ao mesmo tempo, concretizar o direito à vida, principalmente através da efetivação dos direitos sociais à moradia, saneamento, educação, trabalho, liberdade sindical, lazer, etc.

Não basta viver ou conservar a vida. É justo buscar e conseguir a “qualidade de vida”. A Organização das Nações Unidas-ONU anualmente faz uma classificação dos países em que a qualidade de vida é medida, pelo menos, em três fatores: saúde, educação e produto interno bruto. “A qualidade de vida é um elemento finalista do Poder Público, onde se unem a felicidade do indivíduo e o bem comum, com o fim de superar a estreita visão quantitativa, antes expressa no conceito de nível de vida. A saúde dos seres humanos não existe somente numa contraposição a não ter doenças diagnosticadas no presente. Leva-se em conta o estado dos elementos da Natureza – águas, solo, ar, flora, fauna e paisagem – para se aquilatar se esses elementos estão em estado de sanidade e de seu uso advenham saúde ou doenças e incômodos para os seres humanos. (MACHADO, 2009, p. 61)

A proteção ambiental é a conjunção de forças sociais e normativas para possibilitar a toda sociedade uma melhor qualidade de vida. Mesmo que a poluição ao meio ambiente atinja mais acentuadamente as populações socialmente desfavorecidas, a ação em prol do meio ambiente tem de ser coletiva. Nota-se, por decorrência de políticas governamentais ou, muitas vezes, globais, o crescimento desenfreado da poluição em localidades as quais há maior concentração da pobreza. Indubitavelmente, a falta de infra-estrutura, ou seja, saneamento básico, construções regulares, gera a acumulação de resíduos que proporcionam a degradação ambiental e a diminuição da qualidade de vida, afetando geograficamente e, com mais intensidade, pessoas localizadas nas áreas de produção industrial e de descarte do lixo.

“Eventualmente, grupos sociais afetados ou ameaçados podem responder por intermédio de manifestações sociais coletivas ou por ação judicial, mas tais iniciativas demandam condições políticas e sociais favoráveis”. (MARTÍNEZ ALIER, 2007, p. 254) Tangente a isso, se faz menção a necessidade de qualidades sociais favoráveis para a concretização da Justiça Ambiental. Responsabilidade governamental, sustentabilidade ambiental, respeito à dignidade da pessoa humana são valores intrínsecos a realização da Justiça ambiental.

Mas o que significa uma ordem ser justa? Significa essa ordem regular o comportamento dos homens de modo a contentar a todos, e todos encontrarem sob ela felicidade. O anseio por justiça é o eterno anseio do homem por felicidade. Não podendo encontrá-la como indivíduo isolado, procura essa felicidade dentro da sociedade. Justiça é felicidade social, é a felicidade garantida por uma ordem social. Nesse sentido Platão identifica justiça à felicidade, quando afirma que só o justo é feliz e o injusto, infeliz. (KELSEN, 2001, p. 2)

Concernente a idéia de Justiça postulada por Hans Kelsen se Justiça é felicidade social, Justiça Ambiental é, também, felicidade social que garante a harmonização da sociedade a partir de uma ordem social que assegura a qualidade e a manutenção da vida. Portanto, a evolução da Justiça Ambiental deve ser buscada, primeiramente, nos movimentos sociais e construída pela “Ecologia de Saberes[4]”. Para com isso, irradiar o Poder Público. A facilidade que os agentes poluidores encontram nas localidades de instalação das atividades que degradam o meio ambiente é decorrente da falta de ação do Poder Público, concedendo licenças ambientais para a exploração de tal ambiente natural. Educação precária, inexistência de participação política, risco ambiental, pobreza e etnicidade, contribuem satisfatoriamente para o ideal neoliberal de desrespeito às populações nativas e degradação do meio ambiente.

Ou seja, procurou-se tornar evidente que forças de mercado e práticas discriminatórias das agências governamentais concorriam de forma articulada para a produção das desigualdades ambientais. E que a viabilização da atribuição desigual dos riscos se encontra na relativa fraqueza política dos grupos sociais residentes nas áreas de destino das instalações perigosas, comunidades ditas “carentes de conhecimento”, “sem preocupações ambientais” ou “fáceis de manejar, na expressão dos detentores da ciência de fontes de risco. (ACSELRAD, MELLO e BEZERRA, 2009, p. 21)

A pretensão de explicitar que a Injustiça Ambiental[5] é a regra aplicada na sociedade é de simples comprovação. A necessidade que países em desenvolvimento têm de buscar investimentos transnacionais para seus territórios explica o desrespeito e a concretização da Injustiça Ambiental. “Poderia suceder que, como resultado da proibição da exportação de resíduos tóxicos, as indústrias se transfiram para países pobres onde a resistência é menor devido à falta de poder da sociedade, apoiadas por governos corruptos”. (MARTÍNEZ ALIER, 2007, p. 251)

A exportação de lixo, a construção de indústrias globais em países em desenvolvimento, a abundância de mão-de-obra barata, legislação ambiental flexibilizada ou, simplesmente, a omissão do Poder Público, são fatores que propiciam a instauração da Injustiça Ambiental em países desenvolvimentistas ou que, segundo o Banco Mundial, ainda podem ser mais sobrecarregados ambientalmente. Importante mencionar, o memorando do Banco Mundial que, diante de seu conteúdo nefasto à proteção ambiental, se tornou material de exposição social do movimento ambientalista. Tal documento relata que:

A medida dos custos da contaminação prejudicial à saúde depende das rendas perdidas em razão da maior morbidade e mortalidade. A partir desse ponto de vista [estritamente econômico], uma dada quantidade de contaminação prejudicial à saúde deveria ser gerada no país com o menor custo, isto é, o país com salários menores. Penso que a lógica econômica que sustenta o envio e descarga de dejetos tóxicos no país com salários mais baixos é impecável [...]. Sempre tenho pensado que os países subpovoados da África estão muito contaminados, sendo provável que sua qualidade do ar seja muito ineficientemente baixa [sic, o que quis dizer é “alta”], comparada com a de Los Angeles ou México D.F. Apenas é lamentável o fato de que tanta contaminação seja produzida por indústrias não negociáveis (transporte, geração de eletricidade), e que o custo por unidade de transporte dos resíduos sólidos seja tão alto que cria obstáculos para o comércio de resíduos e da contaminação do ar, que tanto aumentaria o bem-estar. (MARTÍNEZ ALIER, 2007, p. 251)

A proliferação das Injustiças Ambientais se faz evidente, também, quando se refere à questão da geopolítica da água. A carência de água que assola as populações marginalizadas, decorrente de políticas irresponsáveis levadas a cabo por empresas transnacionais ou, lamentavelmente, por concessões governamentais a particulares, possibilita a limitação dos recursos hídricos e a sua poluição. Fazendo com que a água disponível para o consumo (quando existente) seja destinada a uma reduzida parte da população privilegiada economicamente.

Estatisticamente comprovada, a escassez de água é evidenciada, na maioria das vezes, em países pobres, onde a minoria detentora do poder outorga a política de distribuição de água. Decorrente da privatização dos recursos hídricos, muitos Estados já racionalizam água. Infelizmente, os mais vitimados por tais políticas, são as pessoas economicamente excluídas.

A discussão de água também pode estar baseada em lutas históricas de racismo e poder. Sob o apartheid, a África do Sul era abertamente discriminatória em sua distribuição de água. Assim, o primeiro governo democrático do país herdou um sério conjunto de problemas de água: escassez de água, distribuição desigual de água baseada em raça em classe, poluição severa das fontes de água, rios pesadamente represados e serviços de saneamento básico abaixo do padrão ou inexistentes para a maioria negra. No princípio parecia que o novo governo havia entendido essas injustiças sociais profundamente enraizadas e estava preparado para eliminar a discriminação de água. Na realidade, o partido majoritário da África do Sul teve a intenção de sanar a desigualdade, garantindo a cada pessoa os direitos básicos de água na nova constituição. O Programa de Reconstrução e Desenvolvimento do Congresso Nacional Africano declarou que o acesso à água residencial como um direito humano era o “princípio de nossa política de recursos de água. Porém, em um estudo de distribuição de água pós-apartheid, os estudantes de questões sobre a água Patrick Bond e Greg Ruiters descobriram que o Congresso Nacional Africano também havia adotado uma abordagem orientada para o mercado e para a administração da água, criando escassez contínua para a maioria pobre e privilégios de água para os que podiam pagar. (BARLOW e CLARKE, 2003, p. 82)

A política neoliberal de que tudo está à venda, inclusive o bem mais precioso para a manutenção da vida – o meio ambiente ecologicamente equilibrado – garante a afirmação da Injustiça Ambiental. O meio ambiente tratado como mercadoria, sendo “coisificado”, para assim, ser possível a atribuição de valor monetário, torna realidade à lucratividade decorrente das riquezas naturais.

Organizar a economia através do mercado pressupõe uma transformação completa de tal forma que a natureza, o ser humano e o dinheiro fossem transformados em mercadorias, passando a ser, no caso dos dois primeiros elementos, denominados pela teoria econômica de “terra” e “trabalho”. (WARREN e FERREIRA, 2002, p. 127)

Outro fator de suma importância que impossibilita a realização da Justiça Ambiental é a má distribuição dos resíduos tóxicos. Contraponde-se a idéia de – Capacidade de Carga – e a abstração que tal conceito possibilita, se acredita que tal perspectiva tenta distribuir resíduos poluentes desigualmente. Na verdade, o que se tem é a transferência de resíduos tóxicos para países em desenvolvimento, ou não industrializados. Países ricos, incapacitados de armazenar dejetos poluentes revolvem, de acordo com o pressuposto de que o outro Estado ainda não esgotou sua Capacidade de Carga, transferir seus “lixos” e continuar a massificação da produção e da poluição industrial.

Dessa forma, se acredita que a Capacidade de Carga possibilita o “Intercâmbio desigual[6]”. Também, diante do entendimento de “Intercâmbio Desigual” se tem o parecer de que a exportação da riqueza natural é, simultaneamente, traduzida pela importação de poluição. Não obstante a imprescindibilidade de um governo nacionalista, que não sucumba a interesses neoliberais, que não seja “entreguista” conforme se observou na década de 1990, na grande maioria dois países latino-americanos, principalmente no Brasil, se deve ter como prioridade para que se desempenhe a Justiça Ambiental.

A natureza é um sistema aberto e alguns dos seus organismos crescem sustentavelmente em níveis muito rápidos. Contudo, não é este o caso das matérias-primas e dos produtos exportados pelo Terceiro Mundo. Ao atribuir preços de mercado à produção de novos espaços, os tempos da produção também são transformados. Nesta equação, ao menos aparentemente, o tempo econômico triunfa sobre o tempo ecológico. A superexploração dos recursos naturais se intensifica quando a relação de intercâmbio se deteriora para as economias extrativas, que têm ao seu encargo o pagamento da dívida externa e o financiamento das importações de que necessitam. Concretamente é essa a tendência que se verifica para muitos países exportadores de recursos. As exportações, medidas em toneladas, crescem mais rapidamente do que seu valor econômico. (MARTÍNEZ ALIER, 2007, p. 290)

O pensamento neoliberal de fundir a questão ambiental com a questão econômica e desenvolvimentista procurou conceber a natureza como mercadoria. Sendo assim, as decisões em prol das necessidades de exploração dos recursos ambientais seriam tomadas pelo “mercado” a fim de se obter lucro em detrimento de resultados devastadores para o meio ambiente local, proporcionando miséria para a população nativa das regiões onde seria extraída a matéria natural. Com isso, se enfatiza a “pobreza localizada e a riqueza mundializada.” (BECK)

Essa combinação entre uma concepção socialmente homogênea da questão ambiental e estratégias neoliberais vem constituir o pensamento ecológico dominante nos meios políticos, empresariais e nas agências multilaterais. Assim, de um modo geral, o debate ecológico deixa de interpelar o conteúdo do modelo de desenvolvimento, naturalizando-se seus pressupostos atuais em três âmbitos: acerca do que se produz, de como se produz e para quem se produz. (ACSELRAD, MELLO e BEZERRA, 2009, p. 15)

A busca incessante pelo conhecimento heterogêneo possibilita a melhoria das condições da qualidade de vida na sociedade. Vive-se amordaçado pelo ideal científico, a verdade propiciada pela ciência una, homogênea, desconsiderando todos os outros saberes não científicos construídos em determinados grupos sociais. A precária valorização do conhecimento comunitário, artesanal e cooperativo, tornou a ciência irracional, distante dos anseios socialmente voltados para o ambiente natural. Visivelmente, o conhecimento científico moderno não cumpriu com sua meta, ou seja, erradicar os problemas fundamentais que assolam a sociedade. “Desde o século XVII, as sociedades ocidentais têm vindo a privilegiar epistemológica e sociologicamente a forma de conhecimento que designamos por ciência moderna”. (SANTOS, 2008, p. 138) A pretensão de construir verdades marcadas pela exatidão de conhecimento, hoje, é avaliada como arrogante, indolente.

O mundo é complicado e a mente humana não o pode compreender completamente. Conhecer significa dividir e classificar para depois poder determinar relações sistemáticas entre o que se separou. Já em Descartes uma das regras do Método consiste precisamente em “dividir cada uma das dificuldades... em tantas parcelas quanto for possível e requerido para melhor as resolver” (Descartes, 1984: 17). A divisão primordial é a que distingue entre “condições iniciais” e “leis da natureza”. As condições iniciais são o reino da complicação, do acidente e onde é necessário selecionar as que estabelecem as condições relevantes dos fatos a observar; as leis da natureza são o reino da simplicidade e da regularidade, onde é possível observar e medir com rigor. Esta distinção entre condições iniciais e leis da natureza nada tem de “natural”. Como bem observa Eugene Wigner, é mesmo completamente arbitrária (Wigner, 1970: 3). No entanto, é nela que assenta toda a ciência moderna. (SANTOS, 2007, p. 63)

Aprender, conhecer a epistemologia do próximo, conduz a uma sociedade plural, aberta, que defenda um conhecimento horizontal, não estagnado, contrário ao conhecimento científico moderno. O conhecimento local, produzido no seio das comunidades em risco ambiental é de imprescindível necessidade para a construção da Justiça Ambiental. “[...] Uma aliança que reúna forças sintonizadas dos movimentos sindicais e ambientalistas, de sem-terras e comunidades indígenas, de pequenos agricultores familiares e pescadores, de grupos remanescentes de quilombos e movimentos sociais de periferias urbanas [...]” (ACSELRAD, MELLO E BEZERRA, 2009, p. 31-32)

A aprendizagem com diferentes culturas vem sendo uma excelente iniciativa para a edificação de conhecimento prático, voltado para as necessidades locais, carentes de preservação ambiental. Sem dúvida, nesse patamar, está a Ecologia de Saberes.

Como conhecimento científico tem sido correntemente evocado pelos que pretendem reduzir as políticas ambientais à adoção de meras soluções técnicas, o Movimento de Justiça Ambiental estrutura suas estratégias de resistência recorrendo de forma inovadora a uma produção própria de conhecimento. Conforme vimos, na expectativa norte-americana destacou-se a pesquisa socioespacial que mostrou que “a composição racial de uma comunidade é a variável mais apta a explicar a existência ou inexistência de depósitos de rejeitos perigosos de origem comercial em uma área”. Quando da discussão de impactos de empreendimento, igualmente se procura construir um quadro abrangente, incorporando questões de participação pública, institucional e política e incluindo a consideração das dimensões sociais, culturais, econômicas e institucionais vivenciadas pelos grupos atingidos, assim como os efeitos dos empreendimentos nos modos de subjetivação e na saúde física e mental de indivíduos e grupos. A produção de conhecimento para a chamada Avaliação de Equidade Ambiental busca evidenciar os efeitos socioambientais desiguais de qualquer atividade pública ou privada que altere de maneira indesejada a maneira como as pessoas moram, trabalham, relacionam-se umas com as outras, elaboram sua expressão coletiva e seus modos próprios de subjetivação. (ACSELRAD, MELLO E BEZERRA, 2009, p. 31-32)

A necessidade de construir multidisciplinarmente a Justiça Ambiental significa a conjunção de diversas áreas do saber, o pensar e o agir contributivo que tende a melhorar e, também, ao incessante diálogo produzido pelas diversas áreas sociais. A construção individual e coletiva deve estar fundamentalmente engajada na busca pelo saber tensionado, direcionado a concretização da Justiça Ambiental, fundamento que propicia a toda a sociedade, sustentabilidade e preservação da vida.

Na ecologia dos saberes a intensificação da vontade exercita-se na luta contra a desorientação. Na ecologia de saberes a vontade é guiada por várias bússolas com múltiplas orientações. Não há critérios absolutos nem monopólios de verdade. Cada saber é portador da sua epistemologia pessoal. Nestas condições não é possível seguir uma só bússola. É preciso avaliar a possível contribuição de cada um em diferentes áreas, ou momentos ou para diferentes objetivos. A distância relativa em relação aos guias é um fator de consolidação da vontade. As escolhas permanentes resultam de que nenhuma intervenção no real, a partir de um só tipo de conhecimento, tem acesso à realidade toda. (SANTOS, 2008, p. 165)

 

4. Considerações Finais
Portanto, diante do exposto, nota-se que a Globalização gera a sociedade de risco, da degradação ambiental e da dificuldade de concretização da Justiça Social que, necessariamente, quando não solidificada, aspira ao aumento das desigualdades sociais. Também se evidenciou no presente trabalho, que a Constituição da República Federativa do Brasil propicia a idealização de uma melhor qualidade de vida, inseparável, indubitavelmente, da Justiça Social e Ambiental.

Não obstante, tendo como pressuposto um Estado Democrático de Direito, defende-se que a constitucionalização da Justiça Ambiental deve irradiar todo o ordenamento jurídico e, indispensavelmente, deve garantir a harmonia nas relações sociais. A coletividade, carente de regulação socioambiental, vive a mercê de políticas que originam a “carnavalização” do meio urbano, decorrente da falta de planejamento, de saneamento básico e de educação ambiental, oriundos de projetos neoliberais que contribuem para inexistência da Justiça Ambiental.

Mediante ao citado, acredita-se que a Justiça Social e a Justiça Ambiental devem ser almejadas de forma que estejam situadas como garantias constitucionais efetiváveis por políticas públicas de Estado, sendo prioridades no que concerne a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. Para isso, faz-se imprescindível desenvolver a idéia da Ecologia de Saberes, cultivando o conhecimento propositivo, plural e contra-hegemônico, que possibilite a respeitabilidade das relações socioambientais. Sendo assim, garantindo a Justiça Social e a Justiça Ambiental que, incontestavelmente, são os princípios basilares de uma democracia justa.



5. Bibliografia

ACSELRAD, Henri; MELLO, Cecilia Campello do Amaral; BEZERRA, Gustavo das Neves. O que é Justiça Ambiental. Rio de Janeiro, Garamond Universitária, 2009.
ADEODATO, João Maurício. Filosofia do direito: uma crítica à verdade na ética e na ciência. São Paulo, Editora Saraiva, 2009.
ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. São Paulo, Malheiros Editores, 2008.
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NOTAS
[*] Página Web Contraloría General de la República. 2011. La Habana Cuba.
[**] Página Web Contraloría General de la República. 2011. La Habana Cuba.
[1] O globalismo neoliberal é uma ação altamente política que no entanto se apresenta de fora absolutamente apolítica. A ausência da política como a revolução! A ideologia prega: não há ação, e sim a execução das leis do mercado mundial, que – infelizmente – tornaram obrigatórias a redução do Estado (social) e da democracia. Contudo se engana quem acredita que a globalização signifique a efetivação de leis do mercado mundial que deverão sempre ser deste ou daquele jeito. Também a globalização econômica – e sobretudo ela – não é um mecanismo, não é automática; ela é na verdade um projeto político praticado, numa constante renovação, por atores transnacionais, instituições e coalizões, Banco Mundial, OMC, OCDE, empresas multinacionais, além de outras organizações internacionais. (BECK, 1999, p. 212)a.
[2]Os princípios da solidariedade e da igualdade são instrumentos e resultados da atuação da dignidade social do cidadão. Uma das interpretações mais avançadas é aquela que define a noção de igual dignidade social com instrumento que confere a cada um o direito ao ‘respeito’ inerente à qualidade de homem, assim como a pretensão de ser colocado em condições idôneas a exercer as próprias aptidões pessoais, assumindo a posição a estas correspondentes. [...] De acordo com a interpretação mais restrita, a igual dignidade social impõe ao Estado agir contra as situações econômicas, culturais e morais mais degradantes e que tornam os sujeitos indignos do tratamento social reservado à generalidade. A valoração em negativo da igual dignidade social significaria apenas que a posição de uns não deve ser degradante em relação àquela de outros. Desse modo, não se atua a dignidade social e muito menos a igual dignidade social. Pode existir uma situação social não degradante que não é digna socialmente, porque a noção de dignidade social não é absoluta, mas relativa ao contexto histórico, cultural, político e econômico de uma comunidade. (PERLINGIERI, 2007, p. 37).

[3] Globalização significa, diante deste quadro, os processos, em cujo andamento os Estados nacionais vêem a sua soberania, sua identidade, suas redes de comunicação, suas chances de poder e suas orientações sofrerem a interferência cruzada de atores transnacionais. (BECK, 1999, p. 30).
[4] IA ecologia de saberes procura dar consistência epistemológica ao saber propositivo. Trata-se de uma ecologia porque assenta no reconhecimento da pluralidade de saberes heterogêneos, da autonomia de cada um deles e da articulação sistêmica, dinâmica e horizontal entre eles. A ecologia de saberes assenta independência complexa entre os diferentes saberes que constituem o sistema aberto do conhecimento em processo constante da criação e renovação. O conhecimento é interconhecimento, é reconhecimento, é autoconhecimento. (SANTOS, 2008, p. 157).
[5] Para designar esse fenômeno de imposição desproporcional dos riscos ambientais às populações menos dotadas de recursos financeiros, políticos e informacionais, tem se consagrado o termo injustiça ambiental. (ACSELRAD, MELLO e BEZERRA, 2009, p. 9).
[6] [...] “Intercâmbio ecologicamente desigual” significa a exportação de produtos oriundos de países ou de regiões pobres desconsiderando as externalidades envolvidas na sua produção e o esgotamento dos recursos naturais, trocados por bens e serviços das regiões mais ricas. O conceito destaca a pobreza e a debilidade do poder político das regiões exportadoras, sua falta de opções no referente à exportação de bens com menor impacto local; insiste na não internalização das externalidades nos preços das exportações e na falta de aplicação do princípio da precaução quando os produtos de exportação são elaborados com tecnologias carentes de comprovação. (MARTÍNEZ ALIER, 2007, p. 289).